Segurança Social à
beira da falência
A falência do sistema de segurança
social pode acontecer em 2011. Esta é a principal conclusão
de um estudo coordenado pelo Dr. Carlos Pereira da Silva, ex-presidente
do Instituto de Gestão dos Fundos de Capitalização
da Segurança Social e professor associado do ISEG. Apesar da almofada
financeira contar com 700 milhões de contos, vai haver uma ruptura
inevitável em 2026 se, até lá, o sistema não
for devidamente remodelado. O Dr. Carlos Pereira da Silva explica porquê.
ExpressoEmprego -
Quais os factores que levaram à situação em que se
encontra a Segurança Social?
Carlos Pereira da Silva - O estudo que foi realizado é uma
actualização do que foi feito para o Livro Branco da Segurança
Social. Em relação a este último estudo, a conclusão
a que se chega agora em termos de sustentabilidade financeira não
é substancialmente diferente, uma vez que as hipóteses demográficas,
económicas e financeiras não foram substancialmente alteradas.
A única diferença em relação à situação
vigente aquando da redacção do Livro Branco, foi a introdução
de algumas modificações na Lei de Bases da Segurança
Social, por exemplo a fixação de uma pensão igual
ao salário mínimo, a consideração da carreira
contributiva completa no cálculo da primeira pensão, e a
introdução de uma quotização para Capitalização
Colectiva de Estabilização (2% sobre os rendimentos do trabalho)
da Segurança Social. Esta capitalização dá
alguma folga ao sistema, prolonga a sua cobertura financeira por cerca
de 15 anos, a partir da primeira ruptura do equilíbrio financeiro
que se verificará por alturas de 2010-2105.
A maturação das carreiras que se aproximará dos 36
anos em 2010 (actualmente os novos reformados chegam à idade de
reforma com uma carreira de cerca de 27 anos), e a longevidade das populações
à idade da reforma, aumentando o peso dos mais idosos na população
reformada, contribuirão para um acréscimo substancial do
peso das pensões, para além de prestações
de apoio à terceira idade com assistência em lares e outros
apoios previstos na Lei. A consideração de emigrantes não
altera o problema de fundo, porque eles também acabarão
por se reformar. A curto prazo, o saldo da conta melhora se as famílias
destes emigrantes não vierem para Portugal.
Volto a sublinhar que o Fundo de Capitalização, que actualmente
tem activos 700 milhões de contos (cerca de 5 meses de pensões)
e se prevê venha a cobrir, entre 2012 e 2015, dois anos de pensões,
se continuar a ser alimentado como previsto na Lei, poderá prolongar
a sustentabilidade financeira do Regime, sem recurso ao Orçamento
de Estado, por mais 15 anos.
Para além do factor demográfico, central nesta problemática,
os outros factores que podem pôr em causa o equilíbrio económico,
e não apenas financeiro, são as mudanças das formas
de trabalho, mais trabalho atípico e em profissão liberal,
a falência de empresas de mão de obra intensiva, as fraudes
não antecipadas e despistadas e as manipulações políticas
de curto prazo, com utilização dos excedentes da Segurança
Social, que vão continuar a ocorrer até 2012, para outros
fins que não previstos na Lei.
EE - O que se
pode fazer para inverter a situação?
CPS - A inversão da situação financeira prevista
passa pela introdução de mecanismos estruturais de correcção
que limitem os gastos futuros, uma vez que, do ponto de vista das receitas,
não se pode agravar o custo do factor trabalho, sob pena de pôr
em causa a competitividade das empresas. Essa limitação
passa necessariamente pela introdução de uma relação
directa entre o custo da prestação futura e o seu financiamento,
pelo menos no que se refere a uma parte da pensão de reforma. Isto
significa que a taxa de contribuição de uma dada geração
de activos deve ser suficiente para pagar as pensões vitalícias
de reforma dessa mesma geração. Como gerações
diferentes podem ter custos diferentes, devido a questões económicas,
demográficas ou outras relevantes, então a taxa de contribuição
(na parte que ficar definida) é diferente e não constante
como se verifica actualmente.
Por outro lado, para o cálculo da primeira pensão dos activos
com menos de 55 anos, deve ser considerada toda a carreira contributiva,
numa transição faseada (aumento entre 1 e 1,5 anos por cada
ano de carreira futura), actualizada em função da inflação,
de forma a evitar manipulações na parte final da carreira.
Finalmente, o Fundo de Estabilização em Capitalização
teria de ser reforçado, para atingir pelo menos o equivalente a
quatro anos com pensões.
EE - Qual o
modelo alternativo para a Segurança Social?
CPS - No Livro Branco eu preconizei que o Regime actual fosse fechado
para as novas gerações que entrassem no mercado de trabalho,
e para aquelas que ainda não tenham direitos adquiridos, a partir
de uma data a fixar. Para esses novos activos o regime seria tripartido:
Uma pensão de base, pública, que poderia atingir no máximo
60% do salário final, uma pensão complementar profissional
obrigatória, que compensasse os trabalhadores entre 10% e 15% do
salário final, e uma pensão individual, com fiscalidade
estável, que lhes permitisse adquirir entre 5% e 10% do salário
final.
Para as gerações actualmente no activo, com 55 anos ou mais,
seria mantido o regime actual com as necessárias correcções.
Para as gerações com menos de 55 anos e mais de 10 anos
de contribuição, manter-se-ia o actual regime, garantia
de uma pensão total no máximo igual a 80% da média
dos salários da carreira, mas criaria um regime complementar obrigatório,
o que pressuporia a introdução de um tecto na pensão
de base, limitado, por exemplo, a 8 salários mínimos. Esta
segunda pensão teria garantia de capital e de rendimento mínimo
equivalente ao rendimento efectivo da dívida pública de
longo prazo.