O outro lado do aumento do Salário Mínimo Nacional
(15-12-2006)
Armindo Monteiro
Presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE)
Recentemente, um relatório da Comissão Europeia sobre competitividade indicou que Portugal é um dos três países da UE com pior crescimento médio da produtividade laboral entre 2000 e 2005. Segundo o documento, o desempenho dos portugueses no emprego cresceu menos de 0,5%, um valor abaixo da média europeia (entre 1 e 2%). Curiosamente, países do leste europeu como a Letónia, a Estónia, a Lituânia, a Hungria ou a República Eslovaca, que constituem os nossos mais sérios concorrentes ao nível da captação de investimento externo, registaram os maiores aumentos de produtividade laboral dos últimos cinco anos.
O rácio entre o PIB e a produtividade de cada trabalhador português situa-se entre 60 e 70% da média europeia, um valor superior a apenas seis países da UE-25 e inferior aos de Espanha, Chipre e Eslovénia. Os indicadores mais altos registam-se no Luxemburgo (mais de 140%), Holanda, Irlanda, França, Alemanha, Bélgica e Áustria. Ora, tendo em conta a evolução da produtividade na UE, não é exagero afirmar que a competitividade empresarial no nosso país se encontra seriamente ameaçada, mais ainda se os custos do trabalho aumentarem exponencialmente.
Acresce que, ainda segundo a Comissão Europeia, Portugal é o país da zona euro onde os custos do trabalho suportados pelas empresas registam uma menor adaptação ao ciclo económico, sendo esta uma das principais justificações para a divergência da economia nacional face às suas congéneres. Em resumo, o nosso país é um dos Estados-membros da UE em que os custos laborais mais aceleram quando o crescimento económico está acima do potencial, não se verificando, em contrapartida, a respectiva contenção quando se atravessa uma fase baixa do ciclo. Com a agravante, acrescenta o mesmo documento, de Portugal não compensar os crescimentos salariais com aumentos de produtividade de nível semelhante.
Este enquadramento não pretende estabelecer qualquer relação entre o salário mínimo nacional (SMN) e a competitividade da economia portuguesa. Nem abordar o risco que me parece moderado da subida em espiral nos patamares salariais seguintes. Apenas pretendo correlacionar o modelo de negócio de alguns sectores económicos com as exigências que resultam do aumento do SMN.
O SMN vai aumentar 4,4% em Janeiro de 2007, fixando-se em 403 euros brutos/mensais.
Posteriormente, o SMN crescerá a um ritmo médio anual de 5,3%, atingindo o valor de 450 euros em 2009 e de 500 euros em 2011. À primeira vista, a medida governamental merece ser saudada, por traduzir um acréscimo do poder de compra dos trabalhadores com remunerações mais baixas. Contudo, as boas intenções têm, por vezes, efeitos perversos que anulam a sua justeza. É obvio que todos gostaríamos que os salários aumentassem em Portugal, em particular para os que usufruem hoje de um menor poder de compra. O valor de 403 euros é, de facto, irrisório, sobretudo se comparado com os salários mínimos do resto da Europa, designadamente com os 2 000 euros pagos na Dinamarca, a pátria da «flexigurança».
No entanto, a generalização é sempre perniciosa e injusta. Como em tudo na vida, convém separar o trigo do joio: os gestores e empresários que consideram não ter condições para pagar um salário acima de um determinado valor para o exercício de uma função laboral especifica daqueles outros que, movidos pela ambição do lucro ou usura, não hesitam em pagar abaixo do valor do trabalho prestado, sem qualquer relação com a riqueza produzida pelo trabalho.
Como bem lembrava o Secretário-geral da ACEGE, Jorge Líbano Monteiro em artigo recente, a discussão em torno do salário mínimo leva-nos a questões éticas e morais que deverão estabelecer uma politica salarial justa e compensadora do esforço de cada um.
Os gestores e empresários têm assim a responsabilidade de encontrar modelos de negócio de valor acrescentado que permitam remunerar o trabalho a níveis salariais mais elevados e portanto mais justos. Manifesto no entanto uma dúvida: conseguirão todas as empresas, até 2011, reformular as suas estratégias de negócio por forma a remunerar qualquer prestação de trabalho a um valor superior a 500 euros?
Para exibir ao país a consciência social que se julgava perdida em supostos desvios neoliberais, o Governo empurra para as empresas o ónus do aumento salarial, enquanto na Administração Pública, impõe contenção na actualização das remunerações. A “generosidade” governamental faz-se assim à custa das empresas, sobre quem, pelos vistos, impende a obrigação de reduzir as desigualdades sociais, mesmo que em sacrifício da respectiva competitividade.
Parece óbvio que a política salarial deve ser encarada não apenas na sua vertente social, mas também na sua vertente puramente económica. É preciso colocar todos os pesos na balança e então decidir se queremos empregos melhor remunerados mas em menor número ou, pelo contrário, empregos em maior número mas mais parcimoniosos. Penso que, na actual conjuntura de reestruturação do tecido produtivo português face à concorrência global, a segunda opção é a que mais nos convém, até porque, se tudo correr bem, terá um carácter temporário.
Com o aumento do SMN, aos empresários continuará a ser exigida uma permanente evolução salarial, sem atender aos acréscimos da produtividade e José Sócrates pode puxar o lustro aos seus galões socialistas sem qualquer dispêndio para as contas públicas, uma vez que a factura será integralmente paga pelas empresas.