Fernanda Pedro
O MAR pode ser uma das «bóias de salvação» do emprego científico
em Portugal. Com efeito, nos últimos anos o país tem assistido a um importante
desenvolvimento das ciências marítimas. A importância da investigação
dos oceanos e da zona costeira portuguesa tem levado muitas instituições
estatais e privadas a desenvolverem formações especializadas e avançadas
nesta área. O recente relatório da Comissão Estratégica dos Oceanos reitera
a necessidade do país possuir uma política abrangente, predeterminada
e de longo prazo para gerir a enorme área marítima sob sua jurisdição,
que corresponde só por si a mais de metade de todo o mar da UE.
Dentro deste contexto, a Marinha portuguesa encontra-se neste momento a desenvolver mecanismos de investigação que provem que a plataforma continental de Portugal continua para lá das 200 milhas. De acordo com o comandante Gouveia e Melo, chefe de serviço de informação e relações públicas da marinha portuguesa, estão a ser preparados dois navios, o «D. Carlos» e o «Gago Coutinho» com equipamentos sofisticados em matéria de investigação para provar nas Nações Unidas que o subsolo e a coluna de água da nossa costa se estende até às 330 milhas, «o que significa acrescentar mais 130 milhas à costa portuguesa e de exclusividade de exploração económica».
Gouveia e Melo afirma que é necessário provar esse direito às Nações Unidas antes de 2009 e só é possível apostando na investigação. Mas Portugal pode não ser o único a querer reivindicar esse direito, e para o comprovar, o comandante revela que todos os dias, se encontram entre três a quatro cruzeiros científicos a fazer investigação na costa portuguesa. «Eles não andam cá a passear e por isso, Portugal não pode descurar a investigação», explica.
Na realidade, existe ainda muito para explorar nas águas do Oceano Atlântico, porque os recursos são imensos. O comandante Lopes da Costa, director técnico do Instituto Hidrográfico, explica que as prospecções e investigação científica efectuadas permitem considerar o mar como importante fonte daqueles recursos, sobretudo nas plataformas continentais adjacentes às terras emersas.
«Os recursos químicos do oceano, tais como a vida marinha associada a fontes hidrotermais, são uma recente e valiosa promessa. A investigação biomédica procura nos mares e nos organismos marinhos respostas para problemas como o cancro e a sida», salienta o comandante. Este responsável adianta ainda que Portugal tem, por exemplo, no mar dos Açores «um laboratório natural», pela existência de fontes hidrotermais. Além disso, revela que os recursos minerais, com mais viabilidade de exploração comercial, parecem ser as areias e os cascalhos, os quais ocupam extensa área, especialmente na plataforma norte.
Com tanto potencial para explorar no fundo do mar, a Marinha tem consciência que para o desenvolvimento científico das ciências do mar em Portugal, é necessário juntar os seus meios e conhecimentos aos da comunidade científica portuguesa. Lopes da Costa garante que existem no país um conjunto de licenciaturas e mesmo formação avançada, mestrados e doutoramentos nas áreas das ciências do mar. «São áreas de formação importantes que podem alimentar, com recursos humanos qualificados, as necessidades em instituições públicas ou empresas, com actividades ligadas ao mar, incluindo a Marinha».
Contudo, Manuel Pinto de Abreu, oceanógrafo, docente e coordenador do departamento de ciências do mar da Universidade Lusófona lamenta a escassez de alunos colocados no ensino superior nos cursos da área das ciências do mar, com excepção da Biologia. «Esta assimetria não possibilitará o desenvolvimento capaz da investigação associada ao Oceano, mesmo que procure recrutar recursos internacionais», refere.
Mesmo nesta situação, o oceanógrafo, assegura que a investigação científica no âmbito das ciências e tecnologias associadas ao Oceano conheceu um desenvolvimento notável nas últimas décadas. Apesar de um acréscimo muito significativo de doutoramentos e mestrados nesta área, João Coimbra, investigador em Biologia Marinha, docente em Ciências Biomédicas do Instituto Médico Abel Salazar no Porto e director do Centro de Investigação Marinha e Ambiental da Universidade do Porto, lamenta que para muitos investigadores portugueses encontrar um posto fixo de investigação é ainda muito difícil em Portugal.
Não obstante, aquele especialista admite que a Fundação para a Ciência e Tecnologia tem conseguido criar nos últimos anos alguns postos e «isso já é um esboço de emprego científico em Portugal». João Coimbra defende que com esta medida os investigadores portugueses já podem vislumbrar alguma saída para a sua actividade, sobretudo quando ainda há espaço para carreiras científicas nos institutos politécnicos e nos laboratórios do Estado, apesar de lamentar que estes laboratórios estejam um pouco decrépitos, «principalmente depois da fusão do Instituto Nacional de Investigação das Pescas e do Mar com o Instituto de Investigação Agrária». João Coimbra aponta ainda um nicho de mercado que é necessário explorar nesta área, a da criação de empresas e aqui, «é fundamental existir uma plataforma estratégica de incentivos».
Também Ricardo Serrão Santos, investigador, director do departamento de Oceanografia e Pescas e pró-reitor da Universidade dos Açores, corrobora esta ideia. «Como os empregos permanentes nas universidades são difíceis, tem que se incentivar à criação de empresas nesta área, mas com a complicada burocracia existente muitos acabam por mostrar algum receio», remata o responsável.