Marisa Antunes
O povo português é o mais sedentário da União Europeia mas, apesar desta aversão generalizada ao exercício físico, existe uma vasta minoria que está a aderir à moda do «fitness». Os números comprovam o fenómeno: em 2000 existiam 600 academias de ginástica, seis anos depois há 1.100 que disputam cerca de meio milhão de clientes, segundo os dados da Associação de Empresas de Ginásios e Academias de Portugal (AGAP).
Um «boom» aproveitado ao máximo pelos professores de ginástica, que até então não escapavam à mesma triste sina de milhares de outros docentes que todos os anos engrossam as fileiras do desemprego. “O mercado de trabalho para professores de educação física, através da via escolar continua completamente saturado mas agora, a situação é completamente diferente: já não faltam ofertas de trabalho para os nossos alunos e muitos deles, ainda antes de terminarem o curso, já estão a trabalhar”, realça Fátima Baptista, coordenadora da Unidade Científico-Pedagógica de Exercício e Saúde, da Faculdade de Motricidade Humana (FMH), de Lisboa.
Ginásios, centros de bem-estar físico, hotéis, hospitais privados e empresas de assistência de luxo a idosos, são muitas as entidades que inundam as principais faculdades do país com convites de recrutamento a licenciados em ciências do desporto. É o que faz a cadeia britânica Holmes Place, já com 12 unidades distribuídas por todo o país e mais sete por inaugurar nos próximos dois anos. “Nós temos interesse em recrutar e fizemos, aliás, vários protocolos com entidades formativas para absorver estes profissionais. O nosso objectivo mais imediato é contratar mais 150 «personal trainers» e professores de grupo até ao final deste ano”, diz Paulo Soares, administrador da Holmes Place.
Uma necessidade que levou mesmo a multinacional a contactar o Ministério da Educação para poder chegar a alguns dos licenciados em ciências do desporto que ficaram de fora na segunda fase do concurso de colocação de docentes nos estabelecimentos escolares. Actualmente, o Holmes Place tem 450 professores, “50% licenciados, 50% com outro tipo de formação em educação física”, explica o responsável. Independentemente do grau académico, todos os candidatos a um lugar na academia passam por um curso formativo com a duração de quatro semanas e com uma taxa de aprovação na ordem dos 70%. Fundamental em todo o processo é, como realça Paulo Soares, a “atitude”. “A simpatia, o acompanhamento, o saber atender e lidar com eventuais reclamações. Aliás, são questões a que o mundo académico dá pouca importância. As faculdades deveriam lembrar aos alunos que eles são prestadores de serviço”, remata.
Também na cadeia nacional Viva Fit se procuram pessoas com formação específica mas acima de tudo “interactivas, extrovertidas e com boa atitude”, lembra o administrador da marca, Pedro Ruiz. Com uma boa dinâmica de mercado, a Viva Fit explora um nicho de mercado significativo: as mulheres sedentárias, que querem perder peso e ficar em forma de maneira descontraída, sem se sentirem intimidadas por um ambiente esteticamente correcto, onde não há lugar para celulites e quilos a mais. “Importámos a ideia dos ginásios exclusivos para mulheres dos Estados Unidos e como cá não havia nada do género resolvemos implementar o conceito. Neste momento temos já três unidades próprias e 27 franchisadas que empregam no total cerca de 200 pessoas”, pormenoriza o administrador. A importação do conceito não podia ter corrido melhor. “Estamos a abrir um ginásio por semana, um pouco por todo o país”, exemplifica, acrescentando que os custos de abertura das unidades para os franchisados estão fixados nos 120 mil euros.
O secretário-geral da AGAP confirma esta tendência generalizada para a expansão das várias cadeias que actuam no mercado nacional, com os consequentes aumentos de facturação. “A taxa de crescimento do sector varia entre os 5 e os 10%”, refere Armando Moreira. A procura do mercado por profissionais de educação física obrigou a “oferta” ao nível das entidades formadoras a acompanhar a tendência para a especialização.
Na FMH, por exemplo, em Junho deste ano, saíram os primeiros 20 profissionais da licenciatura ‘Exercício e Saúde', formação superior iniciada em 2002 e que surge como opção aos cursos para professores de educação física para estabelecimentos escolares e para treinadores desportivos. “Este ramo da educação física permite intervir em contextos diferentes, com pessoas de outros escalões etários.
Os alunos do curso ‘Exercício e Saúde' conciliam os conhecimentos do âmbito da saúde com o «fitness», explicou Fátima Baptista. Uma ‘bagagem' formativa que faz a diferença. A docente lembra: “Muitos professores sabem bem a técnica mas não a sabem prescrever. Não basta ter bons conhecimentos de aeróbica mas é preciso saber qual a intensidade, a progressão e as contra-indicações de se praticar determinado exercício. Saber, por exemplo, se aquela pessoa que tem osteoporose pode ou não fazer abdominais. Ou quais os cuidados a ter quando alguém pratica exercício e toma medicamentos”. Como realça Fátima Baptista, “um curso superior com a duração de quatro anos tem uma carga horária de 3.000 horas e uma formação para instrutor de «fitness» tem dez vezes menos, ou seja, 200 ou 300 horas”.
Existem em Portugal mais de 50 estabelecimentos onde se leccionam vários cursos do universo das ciências do desporto, com diferentes graus académicos e cargas horárias, entre faculdades estatais, privadas e politécnicos.