Ruben Eiras
AS POLÍTICAS activas de emprego adoptadas nos últimos anos
têm sido incapazes de criar postos de trabalho sustentáveis.
Quem o afirma é Luís Pais Antunes, secretário de
Estado do Trabalho, que respondeu à entrevista do EXPRESSO via
"e-mail". Para combater o desemprego, o governante refere que
estas terão que estar mais sintonizadas com as necessidades do
mercado do trabalho.
EXPRESSO - Quais são as perspectivas para o mercado de trabalho
neste ano?
LUÍS PAIS ANTUNES - Na actual conjuntura internacional, tudo
aponta no sentido de que 2003 vai ser um ano difícil, em que assistiremos
muito provavelmente a um aumento importante do desemprego. Trata-se de
um fenómeno que não é exclusivamente português
- vejam-se os números mais recentes do desemprego na Alemanha (a
aproximar-se dos 4,5 milhões de desempregados) ou na França.
E sem uma economia dinâmica, finanças estáveis, empresas
saudáveis e trabalhadores e gestores qualificados, não há
mercado de trabalho que resista. Daí a importância do programa
de reformas iniciado por este Governo em áreas tão importantes
como as da legislação do trabalho, da formação
profissional, da justiça ou da educação.
EXP. - Mas qual é a estratégia concreta do Governo para
combater a subida do desemprego?
L.P.A. - Para criar mais emprego é necessário que
as empresas possam beneficiar de um ambiente legal e económico
que lhes dê condições favoráveis para nascerem
e desenvolverem-se. É precisamente o que não tem existido
nos últimos anos e que se torna imperioso realizar. As reformas
que referi não vão certamente produzir efeitos imediatos.
Mas nem por isso são menos urgentes. No curto prazo, há
que desenvolver todos os esforços no sentido de "baixar a
febre". É esse o sentido e o alcance do conjunto de medidas
que o Conselho de Ministros adaptou nas duas últimas semanas -
e, em particular, o "Programa Emprego e Protecção Social"
e o "Programa de Recuperação de Áreas e Sectores
Deprimidos". Mas são medidas como o "Programa para a
Produtividade e Crescimento da Economia", a reforma da legislação
laboral ou a alteração do Código das Falências
e da Recuperação de Empresas que permitirão tratar
a "doença".
EXP. - Que medidas de fundo deverão ser tomadas para tornar as
políticas activas de emprego mais eficazes?
L.P.A. - Ao longo dos últimos anos foram muitas as medidas
de políticas activas de emprego adoptadas. A sua reduzida eficácia
parece-me resultar claramente da incapacidade, hoje notória, de
tais acções contribuírem para a criação
de mais emprego sustentável. Dificilmente conseguiremos conferir
maior eficácia às políticas activas de emprego enquanto
estas se revelarem desfasadas das necessidades do mercado de trabalho.
EXP. - E como pensa inverter a situação?
L.P.A. - É preciso criar mecanismos que estimulem a formação
em contexto de trabalho na sequência da contratação
de novos trabalhadores, a aposta num forte apoio ao empreendedorismo,
os incentivos à mobilidade, ao teletrabalho e ao trabalho no domicílio
e um conjunto de medidas destinadas a apoiar a inserção
dos trabalhadores em novos postos de trabalho no quadro de processos de
reorganização ou modernização de empresas.
Mas não podemos ter ilusões. Sem relançamento económico,
a eficácia das políticas activas de emprego será
sempre relativa.
EXP. - Uma grande parte dos postos de trabalho destruídos são
de indústrias pouco qualificadas. Provavelmente são empregos
que não voltam mais...
L.P.A. - Um tecido económico faz-se de filamentos de muitas
e variadas naturezas. No nosso país, existem e continuarão
a existir indústrias "menos qualificadas" ao lado de
sectores de tecnologia muito avançada, e comércio de proximidade
a conviver com grandes superfícies comerciais. Mas é impensável
que sectores de mão-de-obra intensiva expostos à concorrência
internacional continuem a ter o peso que ainda têm na estrutura
do emprego em Portugal quando o custo do trabalho noutros países
é 5% do nosso (como acontece, por exemplo, na Indonésia).
A verdadeira questão de fundo não é tanto a dos empregos
que se "perdem", mas a dos que não se "ganham".
Mais uma vez sublinho que temos de criar as condições para
mais e melhor investimento e empreendedorismo, pois só assim nascerão
empresas saudáveis e competitivas sem as quais não há
emprego sustentável.
EXP. - Uma dessas condições é o capital humano qualificado.
Só que, no geral, os portugueses continuam com baixas qualificações
e investe-se pouco na formação.
L.P.A. - Temos à nossa frente três grandes desafios em
matéria de formação profissional: quantitativo, qualitativo
e de racionalização. Quanto ao primeiro, julgo que vamos
no bom caminho. Em 2002, aumentámos significativamente o volume
de formação no âmbito do serviço público
de formação profissional, de 46 para 77 milhões de
horas, o que merece tanto mais relevo quanto, de 2000 para 2001, se tinha
verificado uma diminuição do volume de formação.
Este esforço será intensificado em 2003. Mas não
basta fazer mais. É necessário que a formação
responda eficazmente às necessidades do mercado. Há que
reforçar a formação dos activos. No ano passado,
aumentámos em cerca de 80% o volume das acções de
formação contínua, quando entre 2000 e 2001, o valor
foi apenas de 0,1%. Mas é imperioso que a formação
profissional passe a ser uma das prioridades da contratação
colectiva e das empresas. Por fim, impõe-se um desafio de racionalização
de meios. O esforço financeiro do sistema de formação
profissional não tem encontrado correspondência nos resultados
obtidos. Devemos gastar pelo menos o mesmo, mas ser muito mais exigentes
em termos de realização. A formação profissional
não pode ser um "paliativo social", mas sim um instrumento
eficaz de inserção no mercado laboral e de qualificação
dos activos. Estes são os grandes objectivos da reforma do sistema
de formação profissional que será discutido os parceiros
sociais.