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"Temos de assumir os colaboradores como o motor do nosso sucesso”

José Miguel Leonardo dirige em Portugal a multinacional holandesa de recrutamento Randstad. Engenheiro civil de formação, assumiu em 2014 o desafio de liderar os destinos da consultora de recrutamento. Do seu percurso fazem parte empresas como a The Down Chemical Company, a Imperalum e a Stanley Security, onde ocupou cargos de gestão de topo. Abraçou uma carreira na área dos recursos humanos numa altura em que muito se falava de desemprego. Pouco mais de um ano depois, foi de reconversão profissional e de empregabilidade que falou ao Expresso.

16.10.2015 | Por Cátia Mateus


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Que análise faz da sustentabilidade da recuperação atual do mercado laboral?
Após acentuado declínio, de 2008 a 2013, o mercado tem vindo gradualmente a recuperar, em ritmo lento mas sustentado, acentuando a procura de perfis de área tecnológicas e ao mesmo tempo apresentando muitas oportunidades em áreas comerciais ou de serviço ao cliente. Acredito que possamos assistir durante mais algum tempo a esta redução dos níveis de desemprego, mas devemos ser realistas em perceber que não voltaremos às estatísticas do passado, porque a taxa de desemprego não vai diminuir abruptamente face ao que é a expectativa de crescimento económico do nosso país.

Mas as empresas vão manter esta tendência de aumento no ritmo de contratação?
Acredito que sim e, em algumas funções, vão até ter novas necessidades. Ao mesmo tempo, os modelos flexíveis de contratação têm também impacto nestes números, mesmo que pela sua natureza, sejam temporários, mas são também geradores de oportunidades e reforçam competências a quem se encontra numa situação de desemprego.

Analisando os principais desafios nacionais em matéria de combate ao desemprego, na sua opinião, que fatores identifica como sendo os grandes problemas portugueses no campo da empregabilidade?
Os nossos desafios não são diferentes dos outros países da Europa no que se relaciona, por exemplo, com o desequilíbrio entre a oferta e a procura, em especial nas funções tecnológicas. Em paralelo a flexibilização de modelos de contratação poderá permitir a algumas empresas aumentar os seus recursos humanos, assim como a componente fiscal associada a cada trabalhador. Há um caminho e desafios, mas há também vontade das empresas e das pessoas para responder a estes desafios e por isso acredito que estamos a caminhar no sentido certo.

Mas como se ultrapassam essas questões?
O desequilíbrio entre a oferta e a procura deve ser trabalhado não apenas no presente mas a pensar no futuro, com programas de sensibilização para estas áreas, para que os nossos futuros jovens sigam carreiras nestas áreas. Hoje temos de avaliar a possibilidade de avançar com programas sérios e credíveis de reconversão de competências. Em relação aos modelos de contratação e ao regime fiscal, um dos primeiros passos que poderá ser interessante avaliar é a equiparação de benefícios nos vários modelos de contratação, permitindo assim que estes sejam utilizados pela natureza do trabalho praticado, sem redução de garantias ao trabalhador, mesmo quando se tratem de situações temporárias.

Fala dessa disparidade entre as necessidades das empresas e os perfis dos candidatos disponíveis no mercado, na área tecnológica. É a única onde este gap é mais evidente?
As áreas mais flagrantes são aquelas que são também identificadas um pouco por todo o mundo e que são as áreas STEM – Science, Technology, Engineering and Maths (ciências, tecnologia, engenharias e matemática). A partir daqui, encontramos múltiplas ramificações funcionais, mas todas partem desta mesma base de conhecimento. Este é um gap cada vez mais flagrante chegando ao ponto de, por exemplo, anunciarmos vagas de emprego nesta área e termos uma quantidade exígua de candidaturas, obrigando a processos complexos e demorados de procura de candidatos para dar resposta às necessidades das empresas clientes.

Não é um contrasenso num país com elevados índices de desemprego de longa duração e desemprego jovem, de resto duas grandes bandeiras da Comissão Europeia em matéria de políticas de promoção da empregabilidade?
Em relação ao desemprego de longa duração teremos de seriamente avaliar os perfis disponíveis e reconhecer qual a sua capacidade para fazerem uma reconversão de competências e assim estarem aptos para reintegrar no mercado. No caso do desemprego jovem as empresas têm um papel crucial de através de programas de estágio incluir estes jovens nas organizações, em estágios reais e que permitam a aquisição de competências, ao mesmo tempo que estes jovens devem ter a abertura de espírito e a disponibilidade para saírem fora da sua área de formação, sempre que isso se revele necessário, e aprender e desenvolver as suas capacidades através de oportunidades existentes no mercado. Esta será talvez a forma mais rápida para aproximar a oferta e a procura, permitindo a criação de relações de valor acrescentado entre as partes.

Os candidatos portugueses estão preparados para esse novo posicionamento de que fala, para o facto de terem de estar disponível para uma reconversão em qualquer ponto da sua carreira para áreas de maior empregabilidade?
A mudança é um processo contínuo e deve ser uma característica de qualquer profissional, não apenas em início de carreira mas em toda a sua vida profissional. Temos candidatos verdadeiramente excecionais, com a capacidade de surpreender e de ultrapassar qualquer desafio, ao mesmo tempo que temos pessoas com menos capacidade para o fazer e com resistência a essa adaptação e reconversão. Mais do que algo geracional, é humano. Este processo de mudança é um processo que nos leva além da nossa zona de conforto e por isso é normal que existam resistências. Na Randstad acreditamos que as pessoas conseguem dar este passo e podem contar connosco para dar este passo no caminho da empregabilidade. Nos últimos anos, assistimos a uma elevada tendência de saída de perfis qualificados do país.

Portugal está já em condições de recuperar parte destas “perdas”?
O que é necessário ainda para inverter este cenário? Mais do que a fuga de cérebros devemos preocupar-nos na atração de talentos, tanto nacional como internacional e perceber também se, face à atual conjuntura, os migrantes podem vir a ter também aqui um papel relevante. Por isso devemos procurar aumentar o chamado employer branding das empresas. Ou seja, desenvolver a proposta de valor para os colaboradores como estratégia, não apenas de captação mas também de retenção de talentos. Ao mesmo tempo, é fundamental termos abertura para receber pessoas que tenham as competências necessárias para as funções disponíveis no mercado e nas empresas, assumindo a globalidade do mundo do trabalho.

Em que áreas tem o país criado emprego mais ativamente?
As áreas comerciais e de serviço de apoio a cliente são as de maior crescimento na criação de emprego, existindo também uma retoma nas áreas tecnológicas, engenharia, indústria e consumo.

E as que ainda não conseguiram vencer a estagnação de oportunidades?
As funções transversais estão a demorar a recuperar, como por exemplo áreas administrativas, financeiras e comunicação.

O que aponta como essencial para acelerar o processo nacional de recuperação do emprego atualmente em curso?
É fundamental que saibamos desenvolver programas sérios de análise e de reconversão de competências para os profissionais nacionais. Ao mesmo tempo, devemos ser mais competitivos na proposta de valor que apresentamos aos nossos recursos humanos e não falo exclusivamente de salários, falo também em incentivos e na valorização das pessoas. Temos de assumir os nossos colaboradores, independentemente do seu vínculo, como o motor do nosso sucesso. Só assim, acredito que caminharemos no sentido do sucesso das nossas empresas e da felicidade das nossas pessoas.



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