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«Contratar pessoas é investir»

04.06.2004


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Ruben Eiras

PARA que os gestores se libertem do enfoque total no curto prazo, é crucial que contratem pessoas novas para executarem as tarefas operacionais. "Só assim é que se poderão dedicar à estratégia e ao desenvolvimento da sua própria formação", defende José Ramalho Fontes, director da AESE, uma das escolas de negócios que formam as elites de gestão portuguesas.


EXPRESSO - Para onde vai a gestão em Portugal?

JOSÉ RAMALHO FONTES - Estamos no caminho de profissionalizar a gestão como uma função que utiliza recursos - materiais e imateriais - para atingir objectivos. A nível do ensino, estamos muito influenciados pela escola norte-americana, onde a maioria dos nossos gestores se forma. No que toca à formação pós-graduada, é um processo que precisa de ser sistematizado - só agora é que começaram a aparecer os primeiros doutoramentos em gestão. Mas há um grande progresso no ensino da matéria face a anos anteriores.

EXP. - Há um estilo de gestão português?

J.R.F. - A gestão é uma arte e por isso há um estilo de dirigir português. A destacar pela positiva, os nossos gestores possuem uma grande facilidade de "desenrasque", de flexibilidade nos momentos críticos. Mas, pela negativa, há uma grande tendência para a indisciplina. Numa conversa que tive com José Marques Gonçalves, director da Opel em Portugal, ele referiu que um alemão demora um dia para compreender a mudança num processo de trabalho, mas depois nunca mais a desaprende. Por sua vez, os portugueses aprendem-na em 10 minutos, mas uma semana depois já a desaprenderam. Compete às escolas de negócios dar competências aos gestores portugueses para ultrapassar esta barreira.

EXP. - Na AESE, o método de ensino assenta no estudo de caso. Quais as suas vantagens?

J.R.F.
- Nas escolas tradicionais em Portugal o método de ensino é dedutivo - parte-se da generalização para os casos. Aqui, o método é indutivo - parte-se dos casos para a generalização. Da prática para a teoria. O método de caso não é para incentivar as pessoas a estudarem ou para apresentar exemplos de teorias. Este método proporciona a constituição de uma plataforma de aprendizagem e só deve ser utilizado com alunos que tenham experiência profissional de gestão e direcção já consolidada. Apoiamo-nos nas experiências e no conhecimento de cada um dos formandos, na sua prática de gestão, de modo a que o ensino seja o mais personalizado e individualizado possível. Cada pessoa aplica os seus conhecimentos adquiridos na discussão dos casos. Desta forma, cada formando valida o que tem de positivo, descobre o que tem de negativo e o que precisa de saber em termos de novas ferramentas a adquirir, segundo as circunstâncias específicas de cada um. Isto em Portugal é único - não há nenhuma outra escola no país que faça isto.

EXP. - Este método facilita a ligação da universidade com a empresa?

J.R.F. - O método não é a principal ligação entre a universidade e a
empresa, mas é-o em parte. Isto dá-se quando a escola encontra casos mais apelativos e actuais, e se aproxima das empresas para os escrever. Neste momento, estamos a redigir os casos da Mglass, do MBnet, da Galp, do cartão Vivo, da Fundação Portuguesa de Cardiologia e do Millennium BCP. No limite, é um levantamento sistematizado das boas práticas de gestão realizadas por organizações portuguesas.

EXP. - Porque é que os gestores portugueses não investem mais na sua formação e ainda a encaram como um custo?

J.R.F. - Essa pergunta tem duas respostas: uma a sul e outra a norte do país. No sul, existe uma procura de formação em gestão, bastante sólida, incentivada pelas grandes empresas e pelas multinacionais. O objectivo é assegurar uma boa carreira e atingir novos patamares de exigência. Mas a norte, isso não acontece, porque os dirigentes empresariais estão absorvidos por tarefas mais operacionais, que os impedem de dedicar tempo a coisas importantes, como a estratégia e a sua formação.

EXP. - Não têm tempo para pensar, nem para se formar...

J.R.F. - Pois, o que é um erro fatal. O Filipe Vila Nova, director da Salsa, disse uma coisa surpreendente num colóquio recente: "Eu, em 2003 não cresci, parei para pensar e foi o ano em que tive mais rentabilidade".

EXP. - Então qual é a solução para os gestores ganharem tempo para pensar?

J.R.F.
- Têm de contratar mais pessoas, para se libertarem das tarefas urgentes (o curto prazo) e se concentrarem nas importantes (o longo prazo). A comunicação social tem de animar as empresas para investir nas pessoas. Há que contratar gente nova, formá-los no seu âmbito e deixá-los aprender. A contratação de pessoas não é um custo, é um investimento.





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