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"As pessoas adaptáveis, dificilmente continuarão desempregadas"

Álvaro Fernandez é o único elemento estrangeiro da equipa portuguesa da Michael Page (atual PageGroup). O diretor geral da empresa de recrutamento e seleção, personifica o perfil de um gestor global que não conhece fronteiras geográficas. Em tempos de crise, garante, a adaptabilidade e disponibilidade para recomeçar de novo, noutra área de atividade ou função, pode ser o principal trunfo para um profissional que queira manter-se ativo no mercado. Numa altura em que a empresa que lidera soma 13 anos de atividade nacional, o líder fala sobre os principais desafios que se colocam no sector do recrutamento e do momento de viragem que se está a aproximar. 

30.08.2013 | Por Cátia Mateus


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O PageGroup soma este ano 13 anos de atividade em Portugal. O que mudou no mercado de recrutamento nestes anos?
Iniciamos a atividade em Portugal em setembro de 2000, com uma equipa muito pequena de quatro pessoas e desde então tivemos uma evolução impressionante. Tendo em conta que alcançamos recentemente o marco das 25 mil contratações em território nacional, realizámos uma média de duas mil contratações a cada ano. Neste processo de expansão, a Michael page (agora PageGroup) atravessou todo o tipo épocas em Portugal. Vivemos momentos de crescimento, de crise, voltámos a estar em crescimento - ali por volta de 2011, onde parecia que o mercado se estava  a recompor -, e entrámos novamente em crise no ano passado, que foi um ano difícil para este sector.

E este ano, como têm evoluído?
Estamos muito otimistas com 2013, sobretudo pela forma como a atividade se está a desenvolver este ano e as perspetivas que se adivinham. Se compararmos a evolução das colocações nos primeiros seis meses deste ano, às que tivemos em 2012, registámos já um crescimento de 20% no número de profissionais colocados no mercado. É um crescimento muito importante no atual cenário. No início do ano, quando começámos a verificar estes dados, estávamos muito cautelosos porque não sabíamos se seria um crescimento sustentável no tempo para se manter ao longo do ano, ou se seria uma vaga de contratações gerada por toda a paragem do país nos meses anteriores, como resultado da instabilidade em torno do Orçamento de Estado. Acontece que depois de se ter avançado para uma maior estabilidade nesse campo, pelo menos até junho, a evolução foi muito boa.

Como justifica esse crescimento?
Acredito que as bases da economia estão mais sólidas do que estavam. Entre finais de 2008 e princípios de 2009 foi um ano de downsizing de muitas empresas, nacionais e multinacionais, em Portugal. As empresas que na altura não chegaram a fazer cortes de pessoal e que não se readaptaram, com as crises de 2011 e 2012, terão sido forçadas a realizar mudanças. O que se passa, é que atualmente atravessamos um momento de grande pressão em que as empresas estão a trabalhar com o número mínimo de quadros com que podem trabalhar. As equipas estão reduzidas ao mínimo e não podem trabalhar com menos do que têm hoje. O único caminho possível é o crescimento. Por outro lado, temos notado uma grande diferença de posicionamento dos profissionais e empresários em relação a toda a incerteza e instabilidade que nos tem afetado desde 2011.Estamos mais seguros e otimistas, o que faz com exista um pequeno aumento do número de projetos e um grande aumento da concretização desses projetos, tendo como consequência no crescimento do número de contratações.

O que é que considera fundamental para que esse otimismo se materialize numa realidade, em matéria de criação de emprego?
Estabilidade política e um quadro jurídico estável. Quando as regras do jogo estão em permanente mudança e estamos a fazer novas reformas, ajustes e mudanças a toda a hora, os players internacionais e nacionais ponderam se valerá a pena investir naquele momento, ou esperar por uma eventual nova alteração jurídica lhes seja mais favorável. Quando estamos sempre a mudar, os investimentos, que são potenciais geradores de emprego, vão sendo sucessivamente adiados. É por isso determinante termos um quadro jurídico estável. A nível político é igual. Os sinais de otimismo e melhoria existem, com as recentes notícias de crescimento económico e diminuição do desemprego, pela primeira vez em muito tempo, é agora fundamental que as empresas tenham estabilidade para poderem conduzir os seus negócios.

Esta adversidade que atravessamos, mudou a forma como as empresas recrutam?
Sim. Radicalmente.

De que modo?
Tipicamente, em épocas de crise o recrutamento muda drasticamente, desde logo porque não há margem para erros de casting. Essa falta de margem para falhas faz com que, por um lado, os processos sejam mais demorados porque há mais pessoas que são chamadas a participar no processo de decisão que envolve a escolha de um candidato, por outro, as empresas procuram com estes recrutamentos encontrar e integrar profissionais que aportem uma experiência notória e cuja integração, adaptação e resultados tenham impacto imediato no negócio. Não há tempo para grandes formações nem para esperar até que surjam os primeiros resultados do investimento realizado na contratação. O impacto tem de ser imediato porque as empresas têm pouca margem.

Quer isso dizer que o mercado está mais focado em contratar perfis experientes e não tanto profissionais jovens?
Não é assim tão linear. Há dois planos completamente distintos: o das empresas que procuram profissionais que aportem experiência ao negócio (nas mesmas funções e áreas de negócio, com as mesmas ferramentas informáticas, com os mesmos clientes e o mesmo tipo de atividade), onde há um recrutamento muito cirúrgico, e o plano do recrutamento de jovens profissionais que enfrenta uma clara mudança. O que verificamos quando analisamos o recrutamento dos perfis mais jovens é que, tipicamente, quando os ciclos são positivos, os jovens vêm às entrevistas a exigir uma carreira profissional, com prazos definidos e claro para chegarem a consultores seniores ou diretores. Impressiona quando vês pessoas tão jovens com esta postura. Quando há épocas de crise, as pessoas que estão a sair da universidade mudam de comportamento, talvez porque se dão conta que têm amigos que estão há dois anos à procura de trabalho, sem conseguirem uma única oportunidade. Nesses momentos, vão à entrevista com a postura que deveria ser a única possível num jovem que acaba de sair da universidade: “dá-me uma oportunidade e mostro-te que tenho capacidade de fazer a diferença nesta empresa”.

E há empresas a dar oportunidade a estes qualificados?
Eu noto que há muitas empresas que estão a dar oportunidade a estes jovens. É verdade que o estão a fazer com recurso às ferramentas que a lei permite, como os estágios muito prolongados e os contratos a termo (renovados e renovados e, renovados), mas que estão a dar a oportunidade a profissionais sem experiência de entrarem no mercado de trabalho. E, sinceramente, eu se fosse um jovem profissional neste momento, não teria a mais pequena dúvida em aceitar um estágio profissional, mesmo que fosse não remunerado, porque é a oportunidade de entrar no mercado, na área que se quer entrar. É muito mais importante entrar no mercado e assumir que é um processo de aprendizagem, do que estar permanentemente à procura de um emprego perfeito, sem aceitar nenhuma outra oportunidade.

Que perfil procuram hoje as empresas no momento de contratar?
Claramente o dos profissionais que não estão à espera que as organizações se adaptem a eles, e são capazes de se adaptar eles ao emprego que procuram. Há muita gente desempregada que nos procura para regressar ao mercado. Tentamos colocá-las nos mesmos setores de atividade e nas mesmas funções em que trabalhavam antes, mas em muitos casos é impossível porque não há oportunidades suficientes. O que lhes dizemos é que neste momento o essencial é ter a capacidade de se adaptar ao que há no mercado. Se os profissionais forem capazes de fazer isto, não vão ficar sem trabalho. O problema são as pessoas que não estão dispostas a adaptar-se ao que o mercado pode oferecer. Se o que o mercado pode oferecer neste momento é um posto com funções diferentes das que estava habituado a desenvolver, o que se tem de fazer é agarrar a oportunidade e adaptar-se às novas funções, mesmo que se queira mudar depois. As pessoas que são adaptáveis e móveis geograficamente, não só internacional como também dentro de Portugal, são pessoas que dificilmente vão continuar desempregadas. As pessoas que não estão dispostas a ceder, a adaptar-se a mudar, provavelmente, vão ter mais dificuldade em encontrar uma nova oportunidade.

Qual do setores onde o PageGroup opera tem sentido um maior impacto da conjuntura?
Construção e Banca. A construção em Portugal teve uma paragem radical. Para compensar isto, temos procurado em conjunto com outros escritórios do grupo a nível mundial, recolocar estes profissionais em países como Brasil, África e alguns destinos europeus. O mercado é cada vez mais global e os profissionais portugueses estão muito bem cotados. Dentro da banca, o processo é semelhante. Não há um grande incremento de projetos na banca, muito pelo contrário, está tudo parado. Mas, inversamente, há setores de forte dinâmica.

Quais?
As tecnologias de informação têm tido uma expansão enorme.

Mas a forma de recrutar nas tecnologias também mudou, não?
Sim. Houve uma mudança, mas é um sector muito forte e dinâmico. É difícil ver pessoas desempregadas nas áreas das tecnologias de informação. Tudo o que está ligado às exportações também tem forte dinâmica, com uma grande procura de profissionais para reforçar a área de exportação e contacto com mercados internacionais, nas empresas portuguesas. Temos sentido também muita força na área jurídica. É impressionante como muitas empresas decidiram internalizar os serviços jurídicos, recrutando advogados e especialistas em fiscalidade. Este incremento de contratações na área jurídica, é transversal às empresas e às sociedades de advogados, que também têm vindo a reforçar as suas estruturas para dar resposta a uma maior procura por parte dos clientes.

É possível falar de setores e profissões imunes à crise em Portugal?
Há áreas onde o recrutamento continua a decorrer de forma normal. Mais uma vez as Tecnologias de Informação estão neste grupo. Continuam a contratar e os salários continuam a ser altos. O setor das TI em Portugal está a funcionar muito bem porque conseguiu ter como clientes, não só o mercado interno, como empresas internacionais, prestando serviços de boa qualidade e com preços muito competitivos. Há muitas oportunidades para Portugal nesta área, como também na área dos centros de serviços partilhados. Muitas multinacionais continuam a acreditar em Portugal, como centro estratégico para a implementação das suas estruturas de serviços partilhados para a Europa e outras zonas do mundo. Temos muita facilidade de domínio de idiomas, profissionais altamente qualificados e custos salariais muito competitivos face a outros países, o que atrai estas estruturas. Podemos converter-nos num país que dá suporte a muitas geografias. Mesmo com a crise, temos muitas pessoas que gostariam de trabalhar em Portugal. Depois, apesar de não ser uma área onde se possa falar de imunidade á crise, há um sector muito importante e estratégico que é o do turismo. Portugal é um país que está na moda em termos de turismo. Soubemos atrair novos públicos, com um turismo de qualidade e podemos tirar melhor partido do turismo sénior. Temos boas infraestruturas para isso.

O país enfrenta neste momento de viragem em matéria de emprego. O que é para si determinante para inverter de forma sustentada a atual taxa de desemprego?
O primeiro ponto é a flexibilização das leis laborais. Normalmente, quando falamos de flexibilização todos se assustam defendendo que um mercado mais flexível significará um aumento do desemprego. É verdade que quando se flexibiliza, há um primeiro momento de subida porque as empresas que não conseguiam até ali despedir, têm a oportunidade de o fazer. Mas há um efeito secundário: existindo a possibilidade de despedir com maior facilidade pessoas que não se encaixem na sua estrutura, as empresas assumem mais facilmente o risco de contratar. Um mercado flexível é um mercado mais dinâmico, onde efetivamente há menos garantias de estabilidade, mas também maior eficiência entre os profissionais que sabem que tem de lutar diariamente para fazer o melhor possível o seu trabalho. É igualmente importante incentivar as contratações, através de mecanismos de apoio, de grupos mais problemáticos em matéria de desemprego, como os jovens, os inativos de longa duração ou os profissionais com mais de 50 anos.

Acha que será possível inverter esta tendência de desemprego de forma sólida nos próximos dois anos?
Há que diferenciar o desemprego de longa duração do de curta duração. O de longa duração é o mais preocupante e aquele que temos de trabalhar muito para diminuir e evitar que existam pessoas que não conseguem readaptar-se ao mercado laboral, mas que acredito que seja possível com um trabalho intenso. O de curta duração, a tendência começa a inverter-se. Acredito que à medida que vai crescendo a economia, vão surgindo novos projetos e novas contratações. Sou otimista, acredito numa tendência positiva mas necessitamos de um quadro legal que permita contratar e despedir de uma forma mais célere. Célere, mas justa. Não defendo despedimentos por despedimentos.

Quais são atualmente os grandes desafios das empresas de recrutamento?
A tendência de mercados mais maduros na área do recrutamento, como é o caso do Reino Unido, aos poucos vão chegando. Nestes mercados, cerca de 80% dos processos de contratação são externalizados, enquanto cá uma boa parte ainda é realizada diretamente pelas empresas. O nosso desafio, é demonstrar aos clientes que é melhor terem uma empresa especializada que realize esse processo de identificação de talento e candidatos, para que os departamentos de recrutamento internos façam depois a sua análise, à luz daquilo que é a sua realidade. Podemos ser complementares aos departamentos de recursos humanos das empresas, algo que já acontece com as consultoras em Londres. Temos de fazer as empresas perceberem que este é um modelo muito mais eficiente e que permite a redução de custos ao final do dia, já que estão a dedicar tempo à identificação de candidatos (que nós conseguimos de forma muito mais rápida), deixando para trás tarefas vitais e cada vez mais determinantes como a gestão interna de talento.

Como imagina este mercado de recrutamento e seleção daqui a cinco anos?
Cada vez mais, o que presenciamos em mercados mais maduros, é uma estreita articulação entre as empresas e as consultoras de recursos humanos. Somos atores importantes e vamos ser ainda mais importantes no futuro, porque a velocidade dos negócios faz com que seja preciso encontrar soluções mais rápidas. Nos momentos de crescimento e otimismo, a guerra pelo talento é um facto e toda a gente quer lutar pelos melhores. Acredito que daqui a cinco anos estaremos num ciclo positivo, com negócios muito rápidos, onde as empresas encontrarão suporte nas consultoras de recursos humanos, como forma de contratar rapidamente os melhores. As ferramentas de deteção de talento também serão outras, com a internet e as redes sociais a ocuparem um papel de destaque na forma de atrair talento. As consultoras vão passar a trabalhar a imagem das empresas junto dos profissionais e a seguir estes últimos, no seu dia-a-dia e nas suas carreiras, através destas plataformas. Daqui a cinco anos, nada será igual. O recrutamento passará pelo seguimento das carreiras dos profissionais que interessam à organização, procurando entender quem são as pessoas que estão no mercado, o que fazem, quais os seus objetivos, que interesses têm e como faremos para atrai-los para as nossas empresas. O futuro passa por criar online comunidades de pessoas que queiram integrar as nossas companhias ou que nos interesse captar, através das redes sociais.

Como é que um profissional se consegue hoje destacar no mercado?
O mais importante é que para se ser o melhor, há que gostar do que se faz. Há pessoas que desfrutam tanto do que fazem que brilham naturalmente no seu trabalho. Esse é o primeiro ponto. O segundo é investir constantemente nas qualificações e o terceiro é ser adaptável à realidade. Quem tem capacidade de adaptação aos diversos momentos, consegue sobreviver a tudo e acabar a brilhar novamente. Se queremos ser os melhores, temos de ter capacidade de adaptação. Quando fazemos entrevistas, temos dois tipos de pessoas: as que vêm evidenciar-se pelos seus pontos fortes e pelo fizeram no passado, permanecendo agarradas a isso, e as outras, que analisam quais são as necessidades da empresa com a qual vão reunir, os seus objetivos e projetos, adaptando o seu discurso em função disso, de modo a oferecerem uma solução otimista positiva. Estes são os que normalmente conseguem uma oportunidade. Entre uma pessoa otimista e adaptável e outra que se apresenta como sendo tão boa que deveria ser a escolhida, 90% das empresas escolherá a pessoa positiva, otimista, com determinação e capaz de se adaptar.



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